Inverno

O inverno vem aí, cubram-se de cobertores, verifiquem os esquentadores e preparem-se! Pois da maneira como isto está, nem se sai á rua pró chá, (porque tá frio e não há transportes e os preços, ui os preços,  com o Imposto de Valor Acrescentado, estão loucos e além disso, lá fora  só há moucos,( que nem sabem, nunca ouviram dizer, nunca lhes foram falar, limitaram-se a responder aos que os andavam  a sondar).
       Nem se vai para o trabalho embolsar, pois com corte em despesa e ajudas á realeza pouco existe que nutra a viabilidade económica de uma Pequena Média Empresa!  Por isso o que resta fazer, é fugir ao frio gélido, emigrar esquálido e ébrio, seduzido por um rubor efémero, para um qualquer baldio tépido, onde o salário não veja ao dia 15 o seu lânguido sumário término!
Porque é que nos vergamos á necessidade, nos subjugamos á mediocridade, só para viver na pacatez de fingir de verdade, sermos uma nacionalidade?
       O que espera a sociedade, desta gente já de idade, que eleita por maioria,     só sabe andar aos papéis, brincando como reis, dando carta de alforria, a toda e qualquer porcaria, abjeta, imunda e atroz, sugando de todos nós, o direito de nos sermos, nós.
Um povo, sendo que é dele que se compõe a sociedade, espera justiça, luta à  desigualdade, evolução,  educação,  paz, compreensão, liberdade, pão! O estado não pode ser uma gigantesca maquina de calcular, sempre a subtrair (nunca a somar) o tudo, do pouco, ou nada, que há-de sobrar!

       Mas tenham cuidado com o ambiente, separem o lixo! Não o atirem  ao chão e não façam barulho e não gritem, nas paredes não risquem e não fiquem cá, desapareçam, quantos mais de vocês lá fora melhor, isto aqui vai correr bem, nós somos dignos da vossa confiança, tudo o que estamos a fazer é por vocês, tenham esperança, nós gostamos de vocês, nós compadecemo-nos do vosso sofrimento, nós pedimos desculpa, mas  exigimos mais ainda, porque sabemos que são esforçados, cortamos o dobro do bolo e chacinamos, violamos e queimamos, queimamos tudo! Tudo até á ultima réstia de dignidade que exista num povo, nós queimamos, para o ter na mão, para viver á sua custa, urdindo um medo que o assusta! Um que o paralisa e frustra!

       E fica o povo em convulsão, na eterna esperança da revolução, a que vai  acontecer, mas só pr’o ano, num sábado, ou aquela á tarde, com bandas ao vivo e fêveras no pão! Ou uma com finos e palavras de ordem que desafinadas se ouvem a mil vozes por não haver união nem no como fazer a transição da má gestão á coesão!

       A odisseia da ponte, não a sei tirar da cabeça! Aqueles dias, aqueles comunicados de imprensa ás pressas, aquelas coisas meio que improvisadas, um misto de revivalismo sindicalista, com golpes de tosta mista pró lanche e uma mini pra empurrar, porque assim que der a internacional, é hora de desmobilizar, “tocou a sineta, vamos a despegar”,  fechar a manifestação, picar o ponto e portanto, esperar pelo fim do mês, uma e outra vez, sem que nada mude afinal, sem deixar de ser vegetal, operário enganado e explorado, proletário mas bom cidadão, principalmente para com o patrão, coitado, ele também anda apertado, tem de ter em casa o pão e manter a manufacturação, só que com menos pessoas, com tantas as contas não são boas, fica-se pela metade o rendimento e só para evitar o incumprimento, com os outros, claro está, fornecedores isto é, mas tudo trabalhadores, todos na mesma fileira, todos a servir de cobaia, mais nada,  pois mesmo nas ugt’s e cgtp’s e outras siglas de união comum operária, existe um cancro em propagação, um de a todo custo evitar ser-se a solução, dando ideia que quem os norteia, são os mesmos que eles contestam, numa manipulação astuta de todas as formas de luta àquela corja corrupta.


       É tudo uma paródia! E nós somos os parvos, os parvos que não reagem, os que ficam na margem, sempre a admirar a paisagem, receosos com barriga vazia,  da clivagem da Social democracia, ou da “comunistó-topia”, ou a esquerdó-fagia bipolar, ou a popular hipocrisia, com laivos de xenofobia, ou qualquer outra ideologia que tenha um partido, para dia após dia, se sentar no lugar onde se finge o governar!

       E é o camarada proleta, que mais necessita, que mais apanha e se esforça, que  mais contribui para a coleta. Sucintamente, é embarcados na Catrineta que á deriva num mar de treta, tentamos cumprir uma meta que não é sequer real!  A verdade é que não há nação, não conseguimos união, porque a todo o momento, coitados, somos ludibriados, a abdicar de feriados, e de outros direitos conquistados, só por estarmos cansados e sermos até já insensíveis, ao modo como somos tratados.

       É necessário parar com esta pressa de pagar logo á cabeça, uma divida que não é nossa, encurralando de forma perversa a sociedade que sempre cumpre a promessa, recebendo a ingénua recompensa de  uma vida subalterna onde só, se vagueia escuro adentro com a desditosa ajuda externa, sempre á coca, sempre alerta.

       Falharam, todos nos falharam e persistem na falha, não reconhecendo o erro, não sendo os primeiros a padecer do atestado com que nos encostam ás cordas! O atestado de termos gasto acima das nossas possibilidades, vivendo além do limite que nos cabe em sorte! E nós,  somos culpados por ter acreditado no discurso que os bancos apregoaram, impulsionados os primeiros pela demagogia dos segundos, os governantes, que abriram contas multimilionárias no estrangeiro, tudo com o dinheiro de quem mal tem para ser! E é embriagados por esse poder efervescente de semideuses, que  sorvem do seu próprio narcisismo as acusações com que mantêm na linha este povo pouco letrado, mas com muita educação a educação de se pedir licença, de dizer “se faz favor”, saber-se estar sentado á mesa, engolindo num golpe só, tanto maltrato e violência, por sofrer desta doença, a de permanecer na ausência dum salário ou emprego, part-time, em suma escravidão encoberta de oportunidade, a maior parte do tempo combatendo quem pernoita (por mor da má sorte enjeitada) na mesma agreste e fria barricada.
        
       Mas ainda está para vir o dia em que, em Portugal, os partidos sejam responsabilizados pela nata que nos trazem á tona, boiando, a mando desses “encapuzados” que em segredo aconselham, veementemente,  os governantes, todos eles vindos das escolas de formação, as jotas, as jotinhas, caldeirões de más práticas, disseminadoras de doenças democráticas que cedo ou tarde infectam todos e todas, com os seus pequenos comícios, só para jovens e letrados, de preferência sem ideias próprias, mas com muita vontade de dignificar a camisola, muita vontade de contribuir para a equipa, fazer chegar o clube mais á frente, como se de escolinhas de futebol se tratasse. E é aí que ciranda, em círculos consanguíneos, o poder político,  do Luso povo!

       Apanhem o lixo da rua, separem-no, paguem para nós o reciclarmos e comprem-no em artigos novos taxados com valor acrescentado! Paguem as contas da luz, da água, paguem á segurança social, paguem ás finanças, paguem tudo e atempadamente, contribuam para o fosso da ingestão de dinheiros públicos, dinheiros que se esvaem a pagar dívidas bancárias, juros de mora a investidores lá de fora, descontem e mantenham  o país ligado ás maquinas, numa espécie de roleta  russa constante, em que não se sabe o que nos vai calhar daqui ao fim do mês, quanto mais daqui por  um ano, mais saber o que nos virá quando perdermos o emprego, ou lá longínqua,  na mirabolante  reforma!  Mas não se admirem se no dia em que falharem ao pagamento de uma qualquer factura, o dia seguinte vos ofereça o bem essencial  cortado, seja ele qual for, e não importa o que perderam, ou a que horas o perderam, a verdade é que não há desculpas, neste estado, ou pagas ou és banido! E este é o verdadeiro estado social, se não pagas não fazes parte, para fazeres parte tens de corresponder com aquilo que está a ser exigido a todos e como todos pagam, tu não és diferente e tens de o fazer. Não importa teres opinião contrária á da maioria, não importa acreditares que o maior ato de insurreição é o da desobediência civil, essa da marginalidade,  da persistência, de estrafegar o esperar pela união! Mas ainda assim, todos te dizem,  “tens de ceder”! Mesmo que por dentro a tua lógica e a paixão e o amor á vida e tudo o resto se sinta como num tufão a girar de um lado para o outro, e mesmo assim, ai de ti que não pagues, que não sejas rebanho, que não sejas brando, ai de ti que não tenhas calma por saberes que te estão a explorar e que por isso tu ainda tens de pagar, descontar, contribuir, tens de ser empreendedor, tens de ser tanta coisa, mas nunca, nunca tentes ser tu próprio!

       Se é isso que temos á espera por apoiar o estado, por ajuda-lo nesta missão de edificação de um novo Portugal, assente em turismo, vendendo a retalho o país do bom beber, comer e viver, este país tão no papel, tanto assim que não funciona, não é real, não é possível, este Portugal que não existe, que é só uma fantochada, para nos manter entretidos, fiando conversa de chacha, mais nada! Calados pelo meio do desassossego e da inquietação, pelo  receio que temos sobre como vamos deixar os nossos entes mais queridos se não cumprirmos, se não seguirmos a manada, segura e esclarecida, rumo ao nada! Que Portugal é este?

       Roubam-nos e não bastando, distanciam-nos do passado, obrigando-nos a uma nova diáspora, cheia de pessoas esclarecidas, pessoas que face á vertigem do que seria ser cá, emigram, buscando mais frutuosos dias, vivendo com a consciência, que deixam para trás a sina da luta pela sobrevivência!     

       Alunos uma vez, para sempre alunos! Há sempre mais a aprender, outros mundos, culturas, cidades, sociedades, estruturas, tradicionais, futuristas ou rurais, vamos longe e viajamos e fruímos e inventamos, edificamos e construímos, apaixonamo-nos e amamos, casamos, procriamos, criamos um novo ser, inventamos, educamos e o que é ao certo o que lhes ensinamos? Ensinamos como fugimos? Como debandamos, partimos, desistimos de ser Português, esquecemos tudo o que nos pertence, esta história nossa que não envelhece, que acesa grita ás alvoradas, grita até ás forças armadas, que impeçam esta loucura. A ideia de um país é agregar na sua soberania o lugar para toda a gente coexistir, sem deixar por aí, de fora, ao deus dará, aquele que não se converte, pura e simplesmente não se converte, ao discurso de sermos nós os culpados, enquanto que eles não são tidos, nem achados, nem julgados, condenados, nada!
       Fomos roubados! E não adianta correr atrás do prejuízo! O que há a fazer é muito, imenso até, vasto, mas já antes navegamos rumo ao fim do mundo, navegamos para onde a haver, haveria apenas queda e ainda assim insistimos  e assim fomos e descobrimos, descobrimos senão o que sabíamos, descobrimos que uma vez explorados, para sempre explorados...

       As pessoas parecem não ouvir os artistas, esses “deambuladores” da existência, os nossos poetas, os nossos músicos , revolucionários, os nossos pintores, escultores, calceteiros, estofadores, jardineiros, cozinheiras, arquitetas, jornalistas, obstetras, acamados, atletas, professores e outros doutores, autores de contos e lendas, sonhadores, amadores, anónimos e conhecidos,  velhos, novos, crescidos, tanto faz! Não nos ouvimos, não nos estamos a ver, não nos conseguimos ser, unidos, francamente honestos e justos!
De mim pr’a vós, quando é que nos seremos de novo?



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